yuri petrilli

yuri petrilli

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2000-12-26 Cerquilho SP
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Alguns Poemas

a casa

dentro da casa cabem muitas casas.
as paredes empurram contra as formas
todos os tempos nelas sublimados,
e em cada gesto a casa se transforma.

a cada porta que se abre ou fecha,
a cada coisa que se sente ou solta,
de dentro da caixa ou do álbum de fotos,
desdobra-se, como uma matriosca.

num canto da sala, a casa da infância
se abre, por exemplo, num tropeço,
ali, com suas presenças ausentes,
com seus brinquedos e rostos que esqueço,

e que esquecidos crio e tento achar,
rostos líquidos de voz e de sombra,
vívidos, sensíveis, invisíveis:
sem querer me ferem – e eu desvio o olhar.

dentro da casa cabem muitas casas.
logo no canto oposto à pueril
casa da infância, fechada na pálpebra,
reside a casa que ninguém mais viu,

desmoronando, roída de traças,
sobre seu alicerce imaginário,
cercada de acontecimentos ternos
que não puderam nunca entrar ali.

e na cozinha, no banheiro e quartos
diversas casas se mantêm à espreita
surgem, como na sala, de qualquer canto,
bem como da cama, quando se deita.

também é outra a casa no sofá,
se o corpo se reúne a outro instante
que tenha por acaso ali vivido
em uma casa  – a mesma – já distante.

e o mesmo se aplica a cada objeto,
e a casa comporta em seus corredores
viagens maiores que as de avião:
em qualquer cômodo, a um toque da mão,

a casa de quando ela ainda vinha,
aberta pela chave do perfume,
e a casa de logo depois da morte,
trazida pela roupa no cabide.

e o que dizer dos que a casa habitam?
em cada vida, quantas casas cabem?
a casa se reparte em cada peito,
e se projeta, múltipla, tal como

a luz num prisma, em dispersão,
e torna impossível determinar
onde vivemos – e eu quase sufoco
entre estruturas de concreto e sonho

se paro e olho em seus olhos cansados,
que pousam, bem como os meus também pousam,
sobre a matéria que, em silêncio, guarda
inglórias histórias – e quase morro

sob o peso de tanta casa, nômade,
andarilho de passo dividido,
retendo em mim esta dor singular
de não reter, de tanta casa, um lar.

dentro da casa cabem muitas casas.
o tempo as adormece e não corrói.
nenhuma das casas desaparece,
e mesmo quando alegre a casa dói.

dentro da casa cabem muitas casas.
é claro à vista por trás das janelas.
dentro da casa cabem muitas casas,
porém já não caibo em nenhuma delas.
trenco
Muito bom
22/outubro/2020
-
sthefany
seus poemas são muito bem escritos e belíssimos!
22/maio/2020
-
rosalinapoetisa
Parabéns por tão bela escrita poética, tens muito talento com as palavras. Abraços
28/abril/2020
-
rosalinapoetisa
Muito obrigada pela apreciação de meu poema, sinto-me honrada. Abraços.
28/abril/2020
-
wilson1970
Parabéns Yuri tens talento
19/abril/2020
biancardi
Muito bom mesmo. Seria bom reunir tuas poesias em um livro. Já pensou nisso?
18/abril/2020
biancardi
Belos textos.
20/março/2020

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