Florisvaldo Mattos

Florisvaldo Mattos, é um poeta, professor e jornalista brasileiro.

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Alguns Poemas

Dezembro

Menino ainda, costumava
romper o cristal da manhã
e do macio horizonte
cavalgar o aromado pêlo
haurindo a seiva do dia, tanto me
comoviam os animais no campo.

Na adolescência,
ave, passei às mãos das incertezas:
como a mim permitiam decidi
a vida cantar por não ser nada.

Transitei pelos vales recolhendo
Um pouco de mim mesmo em cada planta
na água dos riachos me banhava
da pedra me enxugava nas durezas
que ao vento domavam e refaziam
meu secreto saber.

Eu era agora um homem,
tanto me diziam, tanto me provava
o contato com os homens ou algo mais.
A lua cheia matava-me no silêncio,
invariável lua que jamais cantei
por pouco ser e muito dizer.

Amanhecia por vezes sobre um couro,
transido de frio, sem pecados.
Amava a terra, doação da manhã,
mesmo quando armas rudes me cortavam
a fímbria da existência: eu era
um pouco das safras transportadas,
da poeira que tropeiros levantavam
misturada a rastro de sangue nas ladeiras
"Um cavalo cortado ao meio", me diziam,
e isso valia como identificação
ao que vem e suporta seus tropeços.

Os companheiros de infância,
muito bem mortos, lá estão
esculpidos em ecos, regressando,
do afã diário aos búzios vesperais,
ignorando armadilhas do sol-posto,
tanto falam-me os gestos, os ruídos.
E como vêm falar do que não foram!

Agora é dezembro, e pouco vale
um coração cruzado de datas,
mesmo punhais de lâminas fecundas,
rebrilhando ao sol do meio-dia,
de flores, de frutos na campestre senda.
Humilho-me por não ser o que mais fui,
consciente mas expondo-me aos assédios
de ventos ruminosos, águas várias
— águas de aboio insopitado e lento.

Agora é dezembro: com seu penacho
de luz acende o caminho, incinerando
as fétidas lembranças, colorindo
ausências de sonora geometria.
Antes triste que perdido
ao sol que nos confunde,
à chuva que nos vence.

Agora é dezembro, um mês guerreiro,
que doma sombras ao calor de espadas.

Quarto Monólogo

(O Fel das Roupagens)

Sobre areia largados utensílios,
à vigilância (naus enraivecidas)
dos cães. Os homens já são água e vento.
Retomemos o rastro dos cavalos,
O tempo regressivo, o sortilégio.
Sopram búzios os corpos esfolados.

Um grito sai das veias. Mutilados
pescoços emigrantes, olhos gastos
revisam espetáculo dos rios:
a guerra está no sangue sem verdades
submissos sem marfim — os absolutos.

Ei, parem. É comigo que eles falam,
os mortos, os prantos dominados.
Ardem de escravidão os nervos mudos.
Para os campos de el-rei, para os poentes,
os trabalhos acendem lábios duros,
os sonhos se aluíram na memória.

É comigo que duelam dedos murchos,
e sou eu quem trafega em suas noites,
piso chão de resgate e pesadelos.
Todos sabem que sou. Os que morreram
guardam o dever retido na montanha,
os ódios recomeçam e há retorno.

Mortos crivam no vidro a fúria toda
do principal momento não vivido.
Humanos gritos (sempre humanos) deixam
nas paredes a intacta geografia
do tempo aprisionado — resistência
do apodrecido chão que os mortos pisam

Meu tempo é medieval: um barão doente
vomita girassóis. Os dentes velhos
removem a canção dos muros frios,
por onde deslizasse mão ossuda,
que dos olhos nascida, florescera
em nave corrompida ou vãos tijolos.

Os bens adormeceram indivisos,
tão feitos do marfim dos patriarcas.
A palavra escondeu as previsões,
súbito amanhecida de mudanças:
o barão é um barão, sempre barão,
doira-se entre soluços e águas mortas.

Olhos pendem acesos da muralha,
riscando negro limo da memória,
e medem a extensão — antessonhado
mundo. Reina ao mesmo tempo inviolado.
Onde o espelho, o relho? Quero um espelho
onde veja o possuído tempo unânime.

o tempo meu, cortando extintos rostos,
apagados gemidos, como lâminas.
Quem vem lá, distante, avançando?
Quem ameaça meu solo, minha fauna?
Quem já próximo está violando o templo?

O espaço jaz imerecido.
Flui a verdade entre caminhos mortos.
Olho em redor: sumiram do terraço
guardas e lavradores — todos hoje
avançam na planície. As armas foram-se.
Devolvido o silêncio, as torres dormem.

Sistema Agrário

Meu canto gravado de um saber oculto de águas
esquecidas fabricarei no campo com suor
de rudes trabalhadores, na chuva sepultando-se
de búzios pontuais, lamentos e desgraças.
Forçosamente rústico caindo sobre troncos,
pelo ar, compacto de húmus e branco vinho caindo
sobre plantações. Sobre homens caindo. Não os sei
com metralhadoras e mortes pesadas flutuando
em suas mãos calosas de sonho e agricultura.
Senão com amargo clamor ao meio-dia, quando
com rijas ferraduras rubro sol golpeia-lhes
decisivo o tórax sombrio. De sangue a sua
permanência rural de árvore e vento.

Materiais e diários, continuamente os vejo
por frios vales e serras recolhendo incertezas
e dores unânimes, pontes que lhes pesam úmidas,
como rios perduráveis, sobre o rosto seguro (banhados
tão por cinzentos rios, girassóis destroçados
vigiando rebanhos e metais decadentes
revisando no tempo em sonora aliança), como
estranhas biografias e equipagens
de passados cavaleiros, em derrota.

Impossuídas colheitas vão durando,
como denso muro de sono cicatrizado
em seu corpo amanhecido sobre a terra, que
pensamentos cruéis e sombras apunhalam.
Meu canto fabricarei com lágrimas e suor
subterrâneo de músculos e ferramentas

Maduram no verde dos cacauais suas asas telúricas.
Nas semeaduras, sob tempestade, reside no solo
seu mecanismo de luta e existência
de incessante labor camponês. Agrário sempre.
Suas armas essenciais, sua geometria agreste
hão de impregnar-se necessárias de úmidas
paisagens agrícolas de horror precipitando-se
sobre homens em silêncio nas estradas pacíficas.
Eles que sonhavam com instrumentos longínquos
terão na cabeça, rugindo sempre uma voz de ameaça,
quando a seus pés um ruído grosso de sacrifícios
vai sua boca de amor sem pão revolucionando.

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