O Solitário
Tristonho e desolado, um homem solitário,
imitava, no aspecto, o Cristo no Calvário.
Em chagas tinha os pés, as mãos e o peito abertos,
e andava a mendigar o pão pelos desertos.
Na voz tinha a ternura e o amor do Nazareno,
prendendo todo mundo em doce olhar sereno.
Solícito e discreto a todos atendia.
Pregava o amor de Deus — o nosso Pai e Guia.
Tratava com carinho e amor as criancinhas,
em cuja voz ouvia a voz das andorinhas.
Cantava de manhã, "rezava a Ave-Maria",
um hino ao sol tecia ao fim de cada dia.
Sem ódio e sem rancor, na trilha da verdade,
pregava sem temor — justiça e Liberdade!
Chicoteado e preso ao tronco de madeira,
sincera a voz soltou no verso derradeiro:
— Não sou Nero, nem judas, nem Caim,
tenho a chaga do amor dentro de mim!