Alcides Werk

Alcides Werk

1934-12-20 Aquidauana, MS
2003-11-13 Manaus, AM
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Alguns Poemas

Do Tempo Entre Duas Águas

A mãe-do-rio virá com suas águas poderosas,
e inundará a várzea,
e cobrirá os jutais e os tapiris,
e invadirá os domínios da mata.

Minha gente conhecerá, ainda uma vez,
o espanto da enchente
e a ilusão dos jutais e das lamas humosas,
e se refugiará nas marombas
com seus animais
e as sementes de novas esperanças.

Os peixes se multiplicarão nos igapós,
e o rio doará à varzea a fertilidade das águas.

As florestas indomadas guardarão, ainda,
as riquezas da terra firme
e o segredo milenar das nossas jazidas.

Então,
convocaremos a força benéfica
que desobstruirá os canais dos nossos sonhos,
e iluminará os nossos corações;

e nos ensinará os caminhos da urbe,
com suas indústrias e seu comércio,
em que não seremos um amontoado de seres revoltados;

e nos ensinará os caminhos da várzea,
em que cultivaremos os nossos alimentos,
sem sermos consumidos pelas águas;

e nos ensinará os caminhos da terra firme,
em que apaziguaremos as florestas e o subsolo,
sem enveredarmos por transamazônicas impossíveis.

E o espírito da cidade será um bom companheiro,
e não nos punirá a cada dia
por nossas vidas;

e a mãe-do-rio permanecerá fértil e generosa,
e apascentará os cardumes
que alimentarão nossos filhos;

e o senhor da mata
porá nos nossos lábios a palavra certa
para o diálogo com as árvores e com a terra.

E terá chegado a hora
em que perpetuaremos o gesto simples
do amanho e da partilha justa,
entre nós mesmos,
dos nossos bens.

O Ouro do Rio Amana

Tuas doces águas, Amana,
de repente se toldaram.

Chegaram dragas, pontões,
canoas, motores, balsas
abarrotadas de homens
falando gírias estranhas,
escafandros, pás, bateias,
mecanismos de sucção
a revolver-te as entranhas,
e o teu relevo de margens:
foi decifrado o segredo
do teu rico aluvião.

As cobiças pessoais
precisam catar o ouro
para urgências nacionais.

Cadê teus patos selvagens,
teus amenos inambus,
tangurupará voltando
(segundo registra a lenda)
de lutas com o japiim,
o som rouco das ciganas
a voz dos uirapurus,
o alarido dos guaribas,
os bandos de caititus,
os socós-boi meditando,
jacarés-pedra espiando,
tracajás quase dormindo
na beira, esquentando o sol?

Cadê tuas ariranhas,
tuas antas e capivaras,
teus tambaquis, tuas piranhas
pretas, teus pirarucus,
teus surubins, teus pacus,
araris e pirararas?

Vai, leva ao Parauari
(que também foi descoberto)
teu choro amargo de virgem
possuída sem amor.

Conta que há alto-falantes
espantando os papagaios;
que em cada motor-de-linha
chegam novos garimpeiros;
que as vilas vão-se formando
nas margens, e em cada tenda
há muitas coisas a venda
e mulheres de aluguel
(brancas, louras, que adoecem
por rejeição natural);
que há muito cabra-da-peste
e cenas de faroeste,
cachaça, carne-de-lata,
cigarro, pilha, sardinha,
leite-moça, mosquiteiro,
lanterna, charque do Sul.

Entrega teu ouro, Amana,
quanto mais cedo melhor.
Quero que sejas tão pobre
que nem se lembrem que existes.

Depois do caso passado,
mesmo sabendo que és triste,
quero fazer um roçado,
levantar um tapiri,
deixar o mundo de lado
e morar perto de ti.

ALCIDES WERK GOMES DE MATOS (Alcides Werk) nasceu em 20 de dezembro de 1934, em Aquidauana, MS e faleceu em 13 de Novembro de 2003, em Manaus, AM.

Filho de Sjukiel Werk e de Alcides Gomes de Mattos. Ainda menino perde sua mãe vítima de malária.

Funcionário de carreira do DCT (posteriormente desmembrado em ECT e DENTEL).

Trabalhou como telegrafista no Tocantins, morou em Belém e em 1954 quando tinha 20 anos foi para Amazonas, fixando-se inicialmente em Manaus, mas indo depois para o Médio Amazonas (Maués, Nhamundá e áreas circunvizinhas), como funcionário de carreira do DENTEL, por onde se aposentou.

De volta a Manaus, lançou, em 74, Da Noite do Rio, cujos poemas passaram a fazer parte de Trilha D’água, lançado em 1980, e reeditado (com acréscimos) em 82, 85 e 94.

Trabalhou também na Imprensa Oficial, onde editou, por dois anos, o Suplemento Literário Amazonas.

O poeta faleceu em Manaus, no dia 13 de novembro de 2003.


SOBRE O AUTOR ↑

Poeta de identidade amazônica, forjada no convívio com o modo de vida interiorano, resultado de suas aventuras pelos altos rios, pelos paranás, pelos lagos distantes, abeberando-se da cultura aborígine.

Esteve sempre envolvido com questões culturais e exaltava a natureza e beleza de Manaus em suas poesias e canções.
Possuía excelente domínio de gramática e com muito gosto se dedicava ao trabalho de edição de livros, uma de suas mais importantes atividades.

Alcides Werk  sempre será o poeta das águas. Enquanto alguns poetas nascidos no Amazonas migraram para outros estados brasileiros, fez a rota contrária. Deixou sua terra, Mato Grosso do Sul, chegando ao Amazonas em 1954, quando tinha apenas 20 anos, onde permaneceu até sua morte. 

Apesar de íntima e apaixonadamente identificado com a região amazônica, Werk não se deixa inebriar pelo jogo fácil das cores. O claro/escuro de sua poesia tem nuances que só o olhar mais contemplativo e paciente poderá perceber. Considerando apenas o aspecto dia/noite, observa-se a gama de símbolos que o poeta utiliza.

Sob as luzes da mídia ou não, as águas que ele cantava ainda estão aqui, talvez mais rebeldes do que nunca com suas secas e cheias batendo recordes. Toda essa fúria, no entanto, se cala nos poemas que Alcides não escreveu.
Faleceu em 2003, deixando 5 filhos.
Alcides Werk.wmv
Gonzaga Blantez Jacaré Letra:Alcides Werk
9. NA PRAIA DA PONTA NEGRA - NO ROADWAY - IGARAPÉ DE MANAUS (Mauri Mrq - Alcides Werk)
PITIU CELDO BRAGA ALCIDES WERK
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Pereira O Lago Das 7 Ilhas
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ALCIDES DAGRACA: DIA QUI TCHUBA TCHOBE
"Verde"
Toró
ALCIDES DAGRACA-IVO PIRES BAND
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