Teófilo Dias

Teófilo Dias

Teófilo Odorico Dias de Mesquita foi um advogado, jornalista e poeta brasileiro, sobrinho de Gonçalves Dias e patrono na Academia Brasileira de Letras.

1854-11-08 Caxias, Maranhão, Brasil
1889-03-29 São Paulo, São Paulo, Brasil
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Alguns Poemas

A Matilha

Pendente a língua rubra, os sentidos atentos,
Inquieta, rastejando os vestígios sangrentos,
A matilha feroz persegue enfurecida,
Alucinadamente, a presa malferida.

Um, afitando o olhar, sonda a escura folhagem;
Outro consulta o vento; outro sorve a bafagem,
O fresco, vivo odor, cálido, penetrante,
Que, na rápida fuga, a vítima arquejante
Vai deixando no ar, pérfido e traiçoeiro;
Todos, num turbilhão fantástico, ligeiro,
Ora, em vórtice, aqui se agrupam, rodam, giram,
E, cheios de furor frenético, respiram,
Ora, cegos de raiva, afastados, disperses,
Arrojam-se a correr. Vão por trilhos diversos,
Esbraseando o olhar, dilatando as narinas.
Transpõem num momento os vales e as colinas,
Sobem aos alcantis, descem pelas encostas,
Recruzam-se febris em direções opostas,
Té que da presa, enfim, nos músculos cansados
Cravam com avidez os dentes afiados.
Não de outro modo, assim meus sôfregos desejos,
Em matilha voraz de alucinados beijos
Percorrem-te o primor às langorosas linhas,
As curvas juvenis, onde a volúpia aninhas,
Frescas ondulações de formas florescentes
Que o teu contorno imprime às roupas eloqüentes:
O dorso aveludado, elétrico, felino,
Que poreja um vapor aromático e fino;
O cabelo revolto em anéis perfumados,
Em fofos turbilhões, elásticos, pesados;
As fibrilhas sutis dos lindos braços brancos,
Feitos para apertar em nervosos arrancos;
A exata correção das azuladas veias,
Que palpitam, de fogo entumescidas, cheias,
— Tudo a matilha audaz perlustra, corre, aspira,
Sonda, esquadrinha, explora, e anelante respira,
Até que, finalmente, embriagada, louca,
Vai encontrar a presa — o gozo — em tua boca.

A Matilha

Pendente a língua rubra, os sentidos atentos,
Inquieta, rastejando os vestígios sangrentos,
A matilha feroz persegue enfurecida,
Alucinadamente, a presa malferida.

Um, afitando o olhar, sonda a escura folhagem;
Outro consulta o vento; outro sorve a bafagem,
O fresco, vivo odor, cálido, penetrante
Que, na rápida fuga, a vítima arquejante
Vai deixando no ar, pérfido e traiçoeiro;
Todos, num turbilhão fantástico, ligeiro,
Ora, em vórtice, aqui se agrupam, rodam, giram,
E, cheios de furor frenético respiram,
Ora, cegos de raiva, afastados, dispersos,
Arrojam-se a correr. Vão por trilhos diversos,
Esbraseando o olhar, dilatando as narinas.
Transpõem num momento os vales e as colinas,
Sobem aos alcantis, descem pelas encostas,
Recruzam-se febris em direções opostas,
Té que da presa, enfim, nos músculos cansados
Cravam com avidez os dentes afiados.

Não de outro modo, assim meus sôfregos desejos,
Em matilha voraz de alucinados beijos,
Percorrem-te o primor às langorosas linhas,
As curvas juvenis, onde a volúpia aninhas,
Frescas ondulações de formas florescentes
Que o teu contorno imprime às roupas eloquentes:
O dorso aveludado, elétrico, felino,
Que poreja um vapor aromático e fino;
O cabelo revolto em anéis perfumados;
Em fofos turbilhões, elásticos, pesados;
As fibrilhas sutis dos lindos braços brancos,
Feitos para apertar em nervosos arrancos;
A exata correção das azuladas veias,
Que palpitam, de fogo intumescidas, cheias,
— Tudo a matilha audaz perlustra, corre, aspira,
Sonda, esquadrinha, explora, e anelante respira,
Até que, finalmente, embriagada, louca,
Vai encontrar a presa, — o gozo — em tua boca.


Publicado no livro Fanfarras (1882). Poema integrante da série Flores Funestas.

In: DIAS, Teófilo. Poesias escolhidas. Sel. introd. e notas Antonio Candido. São Paulo: Conselho Estadual de Cultura, 1960

O Século Caminha

A Assis Brasil

O século é pujante, heróico, inexorável.
— Navio que enristou a quilha incontrastável
Às praias do porvir, lá vai talhando o mar.
Espadana-lhe em vão as bavas hediondas
O inútil preconceito; embalde em crespas ondas
Forceja por tolher-lhe o impávido marchar.

Quebrando à vaga rude a cólera, que espuma,
A — Idéia, o nauta audaz, atira-lhe, uma a uma,
As tradições do cetro e da tiara as leis;
Rota, cai do passado a trágica bandeira;
E de envolta com ela a triunfal esteira
Submerge avidamente as púrpuras dos reis.

Rasga afoito ao futuro as fundas névoas densas
O alento vingador, viril das novas crenças,
Que ruge, solto, livre, indômito e fatal.
Ó déspotas cruéis! ó Césares! é tarde!
Dobrai o régio manto orgíaco e cobarde!
É tempo! Adormecei no olvido sepulcral!

Consolai-vos! — Não mais os vossos membros rotos
Filtrarão sangue vil da história nos esgotos
Aos gritos infernais das ébrias multidões!
— No pólo social a estrela do direito
Ergueu-se, há muito já. No mortuário leito
Repousai. Já não há coroas nem brazões!

O século caminha. Os cadafalsos velhos
Ruíram. Das nações os vários evangelhos
Rasga-os, folha por folha, a garra de Satã;
E os livros feitos pó, virá uma só crença,
E unidos se verão numa harmonia imensa
Os crentes de Jesus, de Buda e do Corã.


Publicado no livro Fanfarras (1882). Poema integrante da série Revolta.

In: DIAS, Teófilo. Poesias escolhidas. Sel. introd. e notas Antonio Candido. São Paulo: Conselho Estadual de Cultura, 196
Teófilo Dias (Caxias MA, 1854 - São Paulo SP, 1889) teve seu primeiro livro de poesia, Lira dos Verdes Anos, publicado por Evaristo Rodrigues da Costa em 1878, no Rio de Janeiro RJ. No mesmo ano participou na Batalha do Parnaso, em São Paulo, em que jovens poetas renovadores atacavam os últimos românticos e buscavam nova inspiração na poesia social. Nos anos seguintes foi colaborador em vários jornais, entre os quais Comédia, O Boêmio, Diário Mercantil e O Meridiano. Também traduziu poemas de Baudelaire, Byron, Longfellow e Musset, entre outros. Formou-se bacharel em Direito em São Paulo, em 1881. Ao longo da vida, exerceu as mais variadas profissões, como sargento do exército, comerciante, professor de gramática e de francês, fiscal de crédito do Banco Real. Entre 1886 e 1887 foi redator dos jornais O Provinciano e Liberal Paulista, órgão oficial do Partido Liberal, no qual foi militante. Foi também deputado provincial em 1885 e 1886, em São Paulo. Sua obra poética inclui Cantos Tropicais (1878), Fanfarras (1882), A Comédia dos Deuses (1887). A poesia de Teófilo Dias é parnasiana e foi fortemente influenciada pela obra de Baudelaire. Segundo o crítico Antonio Candido, "apesar de predominarem numericamente em sua obra os versos de inspiração romântica, as traduções e a poesia social, a sua validade é devida, hoje, aos poemas da primeira parte de Fanfarras, intitulada significativamente 'Flores Funestas'.". Fanfarras é considerado, por muitos estudiosos, o marco inicial do Parnasianismo no Brasil.
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