Santa Rita Durão
Frei José de Santa Rita Durão foi um religioso agostiniano brasileiro do período colonial, orador e poeta. É também considerado um dos precursores do indianismo no Brasil.
1722-01-01 Cata Preta, Santa Rita Durão, Minas Gerais, Brasil
1784 Lisboa
57612
1
17
O Afogamento de Moema
do sexto canto do Caramuru
XXXVI
É fama então que a multidão formosa
as damas, que Diogo pretendiam,
Vendo avançar-se a nau na via undosa,
E que a esperança de o alcançar perdiam,
Entre as ondas com ânsia furiosa,
Nadando o esposo pelo mar seguiam,
E nem tanta água que flutua vaga
ardor que o peito tem, banhando apaga.
XXXVII
Copiosa multidão da nau francesa
Corre a ver o espetáculo assombrada;
E, ignorando a ocasião de estranha empresa,
Pasma da turba feminil que nada.
Uma, que às mais precede em gentileza,
Não vinha menos bela do que irada:
Era Moema, que de inveja geme,
E já vizinha à nau se apega ao leme.
XXXVIII
"Bárbaro (a bela diz), tigre e não homem...
Porém o tigre, por cruel que brame,
Acha forças amor que enfim o domem;
Só a ti não domou, Por mais que eu te ame.
Fúrias, raios, coriscos, que o ar consomem,
Como não consumis aquele infame?
Mas pagar tanto amor com tédio e asco...
Ah! que corisco és tu... raio... penhasco!
XXXIX
Bem puderes, cruel, ter sido esquivo,
Quando eu a fé rendia ao teu engano;
Nem me ofenderas a escutar-me altivo,
Que é favor, dado a tempo, um desengano;
Porém, deixando o coração cativo
Com fazer-te a meus rogos sempre humano,
Fugiste-me, traidor, e desta sorte
Paga meu fino amor tão crua morte?
XL
Tão dura ingratidão menos sentira,
E esse fado cruel doce me fora,
Se a meu despeito triunfar não vira
Essa indigna, essa infame, essa traidora!
Por serva, por escrava, te seguira,
Se não temera de chamar senhora
A vil Paraguassu, que, sem que o creia,
Sobre ser-me inferior é néscia e feia.
XLI
Enfim, tens coração de ver-me aflita,
Flutuar moribunda entre estas ondas;
Nem o passado amor teu peito incita
A um ai somente com que aos meus respondas!
Bárbaro, se esta fé teu peito irrita,
(Disse, vendo-o fugir), ah! não te escondas
Dispara sobre mim teu cruel raio...
E indo a dizer o mais, cai num desmaio.
XLIII
Perde o lume dos olhos, pasma e trema,
Pálida a cor, o aspecto moribundo,
Com mão já sem vigor, soltando o leme,
Entre as salsas escumas desce ao fundo.
Mas na onda do mar, que irado freme,
Tornando a aparecer desde o profundo:
"Ah! Diogo cruel!" disse com mágoa,
E, sem mais vista ser, sorveu-se n’água.
XLIII
Choraram da Bahia as ninfas belas
Que, nadando, a Moema acompanhavam;
E, vendo que sem dor navegam delas,
branca praia com furor tornavam.
Nem pode o claro herói sem pena vê-las,
Com tantas provas que de amor lhe davam;
Nem mais lhe lembra o nome de Moema,
Sem que ou amante a chore, ou grato gema.
XXXVI
É fama então que a multidão formosa
as damas, que Diogo pretendiam,
Vendo avançar-se a nau na via undosa,
E que a esperança de o alcançar perdiam,
Entre as ondas com ânsia furiosa,
Nadando o esposo pelo mar seguiam,
E nem tanta água que flutua vaga
ardor que o peito tem, banhando apaga.
XXXVII
Copiosa multidão da nau francesa
Corre a ver o espetáculo assombrada;
E, ignorando a ocasião de estranha empresa,
Pasma da turba feminil que nada.
Uma, que às mais precede em gentileza,
Não vinha menos bela do que irada:
Era Moema, que de inveja geme,
E já vizinha à nau se apega ao leme.
XXXVIII
"Bárbaro (a bela diz), tigre e não homem...
Porém o tigre, por cruel que brame,
Acha forças amor que enfim o domem;
Só a ti não domou, Por mais que eu te ame.
Fúrias, raios, coriscos, que o ar consomem,
Como não consumis aquele infame?
Mas pagar tanto amor com tédio e asco...
Ah! que corisco és tu... raio... penhasco!
XXXIX
Bem puderes, cruel, ter sido esquivo,
Quando eu a fé rendia ao teu engano;
Nem me ofenderas a escutar-me altivo,
Que é favor, dado a tempo, um desengano;
Porém, deixando o coração cativo
Com fazer-te a meus rogos sempre humano,
Fugiste-me, traidor, e desta sorte
Paga meu fino amor tão crua morte?
XL
Tão dura ingratidão menos sentira,
E esse fado cruel doce me fora,
Se a meu despeito triunfar não vira
Essa indigna, essa infame, essa traidora!
Por serva, por escrava, te seguira,
Se não temera de chamar senhora
A vil Paraguassu, que, sem que o creia,
Sobre ser-me inferior é néscia e feia.
XLI
Enfim, tens coração de ver-me aflita,
Flutuar moribunda entre estas ondas;
Nem o passado amor teu peito incita
A um ai somente com que aos meus respondas!
Bárbaro, se esta fé teu peito irrita,
(Disse, vendo-o fugir), ah! não te escondas
Dispara sobre mim teu cruel raio...
E indo a dizer o mais, cai num desmaio.
XLIII
Perde o lume dos olhos, pasma e trema,
Pálida a cor, o aspecto moribundo,
Com mão já sem vigor, soltando o leme,
Entre as salsas escumas desce ao fundo.
Mas na onda do mar, que irado freme,
Tornando a aparecer desde o profundo:
"Ah! Diogo cruel!" disse com mágoa,
E, sem mais vista ser, sorveu-se n’água.
XLIII
Choraram da Bahia as ninfas belas
Que, nadando, a Moema acompanhavam;
E, vendo que sem dor navegam delas,
branca praia com furor tornavam.
Nem pode o claro herói sem pena vê-las,
Com tantas provas que de amor lhe davam;
Nem mais lhe lembra o nome de Moema,
Sem que ou amante a chore, ou grato gema.
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