José Bonifácio de Andrada e Silva
José Bonifácio de Andrada e Silva foi um naturalista, estadista e poeta brasileiro. É conhecido pelo epíteto de "Patriarca da Independência" por ter sido uma pessoa decisiva para a Independência do Brasil.
1763-06-13 Santos, São Paulo, Brasil
1838-04-06 Niterói, Rio de Janeiro, Brasil
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Ode aos Baianos
Altiva musa, ó tu que nunca incenso
Queimaste em nobre altar ao despotismo;
Nem insanos encômios proferiste
De cruéis demagogos;
Ambição de poder, orgulho e fausto
Que os servis amam tanto, nunca, ó musa,
Acenderam teu estro — a só virtude
Soube inspirar louvores.
Na abóbada do templo da memória
Nunca comprados cantos retumbaram:
Ali! vem, ó musa, vem: na lira doiro
Não cantarei horrores.
Arbitrária fortuna! desprezível
Mais quessas almas vis, que a ti se humilham,
Prosterne-se a teus pés o Brasil todo;
Eu, nem curvo o joelho.
Beijem o pé que esmaga, a mão que açoita
Escravos nados, sem saber, sem brio;
Que o bárbaro Tapuia, deslumbrado,
O deus do mal adora.
Não — reduzir-me a pó, roubar-me tudo,
Porém nunca aviltar-me pode o fado;
Quem a morte não teme, nada teme
Eu nisto só confio.
Inchado do poder, de orgulho e sanha,
Treme o vizir, se o grão-senhor carrega,
Porque mal digeriu, sobrolho iroso,
Ou mal dormiu a sesta.
Embora nos degraus do excelso trono
Rasteje a lesma para ver se abate
A virtude que odeia — a mim me alenta
Do que valho a certeza.
E vós também, BAIANOS, desprezastes
Ameaças, carinhos — desfizestes
As cabalas, que pérfidos urdiram
Inda no meu desterro.
Duas vezes, BAIANOS, me escolhestes
Para a voz levantar a pró da pátria
Na assembléia geral; mas duas vezes
Foram baldados votos.
Porém enquanto me animar o peito
Este sopro de vida, que inda dura,
O nome da BAHIA, agradecido,
Repetirei com júbilo.
Amei a liberdade, e a independência
Da doce cara pátria, a quem o Luso
Oprimia sem dó, com riso e mofa —
Eis o meu crime todo.
Cingida a fronte de sangüentos loiros,
Horror jamais inspirará meu nome;
Nunca a viúva há de pedir-me esposo,
Nem seu pai a criança.
Nunca aspirei a flagelar humanos —
Meu nome acabe, para sempre acabe,
Se para o libertar do eterno olvido
Forem precisos crimes.
Morrerei no desterro em terra estranha,
Que no Brasil só vis escravos medram —
Para mim o Brasil não é mais pátria,
Pois faltou a justiça.
Vales e serras, altas matas, rios,
Nunca mais vos verei — sonhei outrora
Poderia entre vós morrer contente;
Mas não — monstros o vedam.
Não verei mais a viração suave
Parar o aéreo vôo, e de mil flores
Roubar aromas, e brincar travessa
Co trêmulo raminho.
Oh! país sem igual, país mimoso!
Se habitassem em ti sabedoria,
Justiça, altivo brio, que enobrecem
Dos homens a existência;
De estranha emolução aceso o peito,
Lá me ia formando a fantasia
Projetos vil para vencer vil ócio,
Para criar prodígios!
Jardins, vergéis, umbrosas alamedas,
Frescas grutas então, piscosos lagos,
E pingues campos, sempre verdes prados
Um novo Éden fariam.
Doces visões! fugi! — ferinas almas
Querem que em França um desterrado morra:
Já vejo o gênio da certeira morte
Ir afiando a foice.
Galicana donzela, lacrimosa,
Trajando roupas lutuosas longas,
De meu pobre sepulcro a tosca loisa
Só cobrirá de flores.
Que o Brasil inclemente (ingrato ou fraco)
As minhas cinzas um buraco nega:
Talvez tempo virá que inda pranteie
Por mim com dor pungente.
Exulta, velha Europa: o novo Império,
Obra-prima do Céu! por fado ímpio
Não será mais o teu rival ativo
Em comércio e marinha.
Aquele, que gigante inda no berço
Se mostrava às nações, no berço mesmo
É já cadáver de cruéis harpias,
De malfazejas fúrias.
Como, ó Deus! que portento! a Urânia Vênus
Ante mim se apresenta? Riso meigo
Banha-me a linda boca, que escurece
Fino coral nas cores.
"Eu consultei os fados, que não incutem
(Assim me fala piedosa a deusa):
"Das trevas surgirá sereno dia
"Para ti, para a pátria.
"O constante varão, que ama a virtude,
"Cos berros da borrasca não se assusta,
"Nem como folha de álamo rejeite
"Treme à face dos males.
"Escapaste a cachopos mil ocultos,
"Em que há de naufragar como até agora,
"Tanto áulico perverso — em França, amigo,
"Foi teu desterro um porto.
"Os teus BAIANOS, nobres e briosos,
"Gratos serão a quem lhes deu socorro
"Contra o bárbaro Luso, e a liberdade
"Meteu no solo escravo.
"Há de enfim essa gente generosa
"As trevas dissipar, salvar o Império;
"Por eles liberdade paz, justiça
"Serão nervos do Estado.
"Qual a palmeira que domina ufana
"Os altos topos da floresta espessa:
"Tal bem presto há de ser no mundo novo
"O Brasil bem-fadado.
"Em vão de paixões vis cruzados ramos
"Tentarão impedir do sol os raios —
"A luz vai penetrando a copa opaca;
"O chão brotará flores."
Calou-se então — voou. E as soltas tranças
Em torno espalham mil sabeus perfumes,
E os zéfiros as asas adejando
Vazam dos ares rosas.
Queimaste em nobre altar ao despotismo;
Nem insanos encômios proferiste
De cruéis demagogos;
Ambição de poder, orgulho e fausto
Que os servis amam tanto, nunca, ó musa,
Acenderam teu estro — a só virtude
Soube inspirar louvores.
Na abóbada do templo da memória
Nunca comprados cantos retumbaram:
Ali! vem, ó musa, vem: na lira doiro
Não cantarei horrores.
Arbitrária fortuna! desprezível
Mais quessas almas vis, que a ti se humilham,
Prosterne-se a teus pés o Brasil todo;
Eu, nem curvo o joelho.
Beijem o pé que esmaga, a mão que açoita
Escravos nados, sem saber, sem brio;
Que o bárbaro Tapuia, deslumbrado,
O deus do mal adora.
Não — reduzir-me a pó, roubar-me tudo,
Porém nunca aviltar-me pode o fado;
Quem a morte não teme, nada teme
Eu nisto só confio.
Inchado do poder, de orgulho e sanha,
Treme o vizir, se o grão-senhor carrega,
Porque mal digeriu, sobrolho iroso,
Ou mal dormiu a sesta.
Embora nos degraus do excelso trono
Rasteje a lesma para ver se abate
A virtude que odeia — a mim me alenta
Do que valho a certeza.
E vós também, BAIANOS, desprezastes
Ameaças, carinhos — desfizestes
As cabalas, que pérfidos urdiram
Inda no meu desterro.
Duas vezes, BAIANOS, me escolhestes
Para a voz levantar a pró da pátria
Na assembléia geral; mas duas vezes
Foram baldados votos.
Porém enquanto me animar o peito
Este sopro de vida, que inda dura,
O nome da BAHIA, agradecido,
Repetirei com júbilo.
Amei a liberdade, e a independência
Da doce cara pátria, a quem o Luso
Oprimia sem dó, com riso e mofa —
Eis o meu crime todo.
Cingida a fronte de sangüentos loiros,
Horror jamais inspirará meu nome;
Nunca a viúva há de pedir-me esposo,
Nem seu pai a criança.
Nunca aspirei a flagelar humanos —
Meu nome acabe, para sempre acabe,
Se para o libertar do eterno olvido
Forem precisos crimes.
Morrerei no desterro em terra estranha,
Que no Brasil só vis escravos medram —
Para mim o Brasil não é mais pátria,
Pois faltou a justiça.
Vales e serras, altas matas, rios,
Nunca mais vos verei — sonhei outrora
Poderia entre vós morrer contente;
Mas não — monstros o vedam.
Não verei mais a viração suave
Parar o aéreo vôo, e de mil flores
Roubar aromas, e brincar travessa
Co trêmulo raminho.
Oh! país sem igual, país mimoso!
Se habitassem em ti sabedoria,
Justiça, altivo brio, que enobrecem
Dos homens a existência;
De estranha emolução aceso o peito,
Lá me ia formando a fantasia
Projetos vil para vencer vil ócio,
Para criar prodígios!
Jardins, vergéis, umbrosas alamedas,
Frescas grutas então, piscosos lagos,
E pingues campos, sempre verdes prados
Um novo Éden fariam.
Doces visões! fugi! — ferinas almas
Querem que em França um desterrado morra:
Já vejo o gênio da certeira morte
Ir afiando a foice.
Galicana donzela, lacrimosa,
Trajando roupas lutuosas longas,
De meu pobre sepulcro a tosca loisa
Só cobrirá de flores.
Que o Brasil inclemente (ingrato ou fraco)
As minhas cinzas um buraco nega:
Talvez tempo virá que inda pranteie
Por mim com dor pungente.
Exulta, velha Europa: o novo Império,
Obra-prima do Céu! por fado ímpio
Não será mais o teu rival ativo
Em comércio e marinha.
Aquele, que gigante inda no berço
Se mostrava às nações, no berço mesmo
É já cadáver de cruéis harpias,
De malfazejas fúrias.
Como, ó Deus! que portento! a Urânia Vênus
Ante mim se apresenta? Riso meigo
Banha-me a linda boca, que escurece
Fino coral nas cores.
"Eu consultei os fados, que não incutem
(Assim me fala piedosa a deusa):
"Das trevas surgirá sereno dia
"Para ti, para a pátria.
"O constante varão, que ama a virtude,
"Cos berros da borrasca não se assusta,
"Nem como folha de álamo rejeite
"Treme à face dos males.
"Escapaste a cachopos mil ocultos,
"Em que há de naufragar como até agora,
"Tanto áulico perverso — em França, amigo,
"Foi teu desterro um porto.
"Os teus BAIANOS, nobres e briosos,
"Gratos serão a quem lhes deu socorro
"Contra o bárbaro Luso, e a liberdade
"Meteu no solo escravo.
"Há de enfim essa gente generosa
"As trevas dissipar, salvar o Império;
"Por eles liberdade paz, justiça
"Serão nervos do Estado.
"Qual a palmeira que domina ufana
"Os altos topos da floresta espessa:
"Tal bem presto há de ser no mundo novo
"O Brasil bem-fadado.
"Em vão de paixões vis cruzados ramos
"Tentarão impedir do sol os raios —
"A luz vai penetrando a copa opaca;
"O chão brotará flores."
Calou-se então — voou. E as soltas tranças
Em torno espalham mil sabeus perfumes,
E os zéfiros as asas adejando
Vazam dos ares rosas.
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João Jorge Peralta
Por gentileza, quando e onde foi publicado esta poema de José Bonifácio? Por gentileza informe a fonte. Sou estudioso da obra de Jose Bonifacio.
Grato.
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21/abril/2024