Tronco

Poderia dizer-te, vem,
mas como descrever
essa vinda se não há
nenhum verbo que
se ajuste ao teu
nome impronunciável.

Debruço-me, hirta,
na memória do silvo,
num sono circular,
e é a sombra que vejo,
a cruz ou o seu contorno,
as pálpebras das aves
e o sonho fundo
de rosas-de-toucar.

Mas vem, a esta paragem
de névoa, é à força de não
vermos que aprendemos,
crianças ávidas de peixes
de onde o mar se levanta
num halo dourado.

Vem, nítido, mais alto
que o lamento,
mais líquido que o desejo,
num rouco movimento
que dança e renuncia
incapaz de ser ausente.


Vem, onírico, de corpo
fragmentado,
desconstruído no sonho
em forma de abecedário.
Primeiro o tronco, depois
as mãos, os pés e o falo;
os ombros, o rosto,
como o de um filho
erguido do chão,
para sempre amado.


E agora as pálpebras,
de sal   vitral  de  pássaro
fecha-mas,
torna-me informe,
diz o meu nome,
pede-me o que nem sei
imaginar; rouba-me,
o poema, a cinza a neve,
o pulso decepado
ou quem sabe se a cor
a dor de meus olhos
mudos    alvoroçados.

Leva-me
como se só Tu existisses
na intimidade das flores,
nos lábios dos mastros,
leva-me  nua e morta
no dorso de teu laço
leva-me  leva-me
até o coração me rebentar.
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Prémios e Movimentos

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