Herberto Helder
Herberto Helder de Oliveira foi um poeta português, considerado por alguns o 'maior poeta português da segunda metade do século XX' e um dos mentores da Poesia Experimental Portuguesa.
1930-11-23 Funchal
2015-03-23 Cascais
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Nunca Mais Quero Escrever Numa Língua Voraz
nunca mais quero escrever numa língua voraz,
porque já sei que não há entendimento,
quero encontrar uma voz paupérrima,
para nada atmosférico de mim mesmo: um aceno de mão rasa
abaixo do motor da cabeça,
tanto a noite caminhando quanto a manhã que irrompe,
uma e outra só acham
a poeira do mundo:
antes fosse a montanha ou o abismo —
estou farto de tanto vazio à volta de nada,
porque não é língua onde se morra,
esta cabeça não é minha, dizia o amigo,
esta morte não me pertence,
este mundo não é o outro mundo que a outra cabeça urdia
como se urdem os subúrbios do inferno
num poema rápido tão rápido que não doa
e passa-se numa sala com livros, flores e tudo,
e merda, não é justo!
quero criar uma língua tão restrita que só eu saiba,
e falar nela de tudo o que não faz sentido
nem se pode traduzir no pânico de outras línguas,
e estes livros, estas flores, quem me dera tocá-los numa vertigem
como quem fabrica uma festa, um teorema, um absurdo,
ah! um poema feito sobretudo de fogo forte e silêncio
porque já sei que não há entendimento,
quero encontrar uma voz paupérrima,
para nada atmosférico de mim mesmo: um aceno de mão rasa
abaixo do motor da cabeça,
tanto a noite caminhando quanto a manhã que irrompe,
uma e outra só acham
a poeira do mundo:
antes fosse a montanha ou o abismo —
estou farto de tanto vazio à volta de nada,
porque não é língua onde se morra,
esta cabeça não é minha, dizia o amigo,
esta morte não me pertence,
este mundo não é o outro mundo que a outra cabeça urdia
como se urdem os subúrbios do inferno
num poema rápido tão rápido que não doa
e passa-se numa sala com livros, flores e tudo,
e merda, não é justo!
quero criar uma língua tão restrita que só eu saiba,
e falar nela de tudo o que não faz sentido
nem se pode traduzir no pânico de outras línguas,
e estes livros, estas flores, quem me dera tocá-los numa vertigem
como quem fabrica uma festa, um teorema, um absurdo,
ah! um poema feito sobretudo de fogo forte e silêncio
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