Trapo

O dia deu em nada?

A fome, o fogo, a sede
que pulsaram fortes
nas manhãs de outrora,
nas noites cheias de estrelas
extinguem-se hoje
sem muitas palavras, sem alarde
nesta praia, no final da tarde.
Sou agora mínimos desejos.
Nas veias corre água do mar.
O coração esfarela-se em areia.
O vulcão dentro do peito
que me deu o mundo inteiro
e me levou aos sete mares, aos mil abraços
aos reinos do sol, das sombras, do medo
dissipa-se em água, em anônimo cansaço
que se esvai como a maré entre os dedos.
Não parece sobrar nada
do que antes foi ardor e sonho.
No meio da vida,
sou fim ou sou começo?
Me desfaço no teu solo
ó Rio de Janeiro,
sou solta branca rosa que bóia
no mar de suas auroras
na boca de suas noites.
Sou finalmente neutro,
sem primavera, côr ou aroma.


Rio de Janeiro, 8 de março 1997
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