Pierre Albert-Birot

Pierre Albert-Birot

1876-04-22 Angoulême
1967-07-25 Paris
1493
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Alguns Poemas

Décimo-Terceiro Poema

Huh huh huh ha e então as palavras com seu ar de ser alguém
O verbo ele tudo e todos
Ama e presta-se à pessoa
Ela ama
Ruas casas cidades céu o verbo doou tudo
A pessoa caminha pelas cidades e olha o céu
Minha casa meu rosto as árvores ele e vós
O primeiro dia e o último
A pessoa trancada em pequenos quadrados de tempo
Presta atenção nos carros cura suas mãos e faz bebês
Paula ama sua mãe
Meu pai está em São Paulo
Ele retornará amanhã
Sem a bondade do verbo ficávamos no infinitivo
Este maravilhoso tudo e todos
Que a ninguém conhece
Mesmo assim melhor o tédio de nascer e morrer
Como fazemos o sol erguer-se ao dizer é dia
(tradução de Ricardo Domeneck, publicada no número impresso de estréia daModo de Usar & Co.)
:
Treizième Poème
Pierre Albert-Birot
Heu heu heu ha et puis des mots qui ont l´air d´être quelqu´un
Le verbe lui le tout et le toujours
Aime et se prête à la personne
Elle aime
Rues maisons villes ciel le verbe a tout donné
La personne marche dans les villes et regarde le ciel
Ma maison mon visage les arbres lui et vous
Le premier jour et le dernier
La personne enfermée dans les petits carrés du temps
Prend garde aux voitures soigne ses mains et fait des enfants
Paul aime sa mère
Mon père est à Paris
Il reviendra demain
Sans la bonté du verbe nous restions à l´infinitif
Ce merveilleux tout et toujours
Qui ne connaît personne
Pourtant mieux vaut l´ennui de naître et de mourir
Puisqu´on fait lever le soleil en disant it fait jour
Pierre Albert-Birot nasceu em Angoulôme, em 1876. Contemporâneo exato dos dadaístas de Zurique, passa a editar sua revista SIC (Sons, Idées, Couleurs) em 1916, mesmo ano em que Hugo Ball, Tristan Tzara, Hans Arp, Marcel Janco e outros fundam o Cabaret Voltaire, numa revolta estÉtica, rebelando-se contra a situação política da Europa naquele momento e contra a distorção literária (literarizante, deveria dizer) que obnublara a multiplicidade poética de escrita&performance a partir do declínio da saúde poética do medievo. Pelas páginas de SIC, passariam alguns dos poetas mais inovadores do início do século XX, como Guillaume Apollinaire, Tristan Tzara, Pierre Reverdy ou Philippe Soupault.
 
Segundo escritores como Hugh Kenner e Guy Davenport, o que nós conhecemos como vanguarda desaparece após o naufrágio da Europa na Primeira Grande Guerra e suas conseqüências sociais e políticas posteriores (guerra que causou a morte de protagonistas centrais das vanguardas, como Henri Gaudier-Brzeska, Guillaume Apollinaire, August Stramm e Georg Trakl, entre outros), ao que poderíamos incluir a decepção dos artistas em plena Revolução Russa, que afundaria em perseguições a escritores e poetas, levando uns ao exílio (como Tsvetáieva), outros à morte em campos de trabalho forçado (como Mandelshtam), alguns ao suicídio (como Maiakóvski e a mesma Tsvetáieva, ao retornar à Rússia), e outros à existência à margem, vendo a prisão e o fuzilamento de familiares, como foi o caso de Akhmátova.
 
A partir daí, a poesia moderna passa a ser uma reconstrução de escombros sobre escombros. Eliot (“these fragments I have shored against my ruins”) entrega-se cada vez mais à nostalgia de um passado irrecuperável, o que já estava de certa forma previsto em The Waste Land (1922). Segundo Kenner (em The Pound Era), Ezra Pound entrega-se a (tarefa sobre-humana) construir sozinho o Renascimento que ele previra antes da Grande Guerra, tentativa da qual surgem os Cantos, ainda que esta ânsia civilizatória tenha implicações complicadíssimas, e nós hoje conheçamos os resultados do caso de Pound, ao equivaler centralização política e renascimento artístico. Pierre Albert-Birot, após criar seus poemas sonoros, seus poèmes à crier et à danser, volta-se para a escritura de seu épico em seis volumes, reunidos mais tarde sob o título Les Six livres de Grabinoulor, desaparecendo em obscuridade. A hegemonia cairia nas mãos de poetas ligados a uma visão literária da multiplicidade poética, como Eliot, André Breton e seu grupo surrealista, que, de certa forma, podemos dizer que apascenta a vaca sagrada da poesia-como-franquia-da-Literatura de volta a seu estábulo seguro, distante de poetas como Gertrude Stein, Hans Arp, Oswald de Andrade, Raymond Roussel, assim como a arte visual tecnicamente conservadora de alguém como Salvador Dalí sobrepõe-se às invenções mais anárquicas de Raoul Hausmann, Hannah Höch e Kurt Schwitters.
 
Assim como muitas vezes o marxismo-psicanalista e linear dos surrealistas era mais palatável que a poesia paratática e polifônica dos dadaístas, que operavam contra a noção de exegese e não raro abandonavam mesmo a semântica, sem as belas imagens pós-românticas do grupo de Breton. Algumas das vanguardas que pareciam insistir na conjugação entre ética e estética, como os dadaístas, desapareceram da atenção do mundo até serem resgatadas pelos grupos de vanguarda da década de 50, como osLettristes (França), o Wiener Gruppe (Áustria), a New York School e os Beats (E.U.A), o Grupo Noigandres (Brasil), o British Poetry Revival (Inglaterra), o Dau al Set (Catalunha), cada um destes grupos enfatizando, obviamente, o que interessava à sua própria poética, pois isto é sincronia histórica.
 
A poesia de Pierre Albert-Birot viria a ser determinante, segundo Marjorie Perloff (em seu livroFrank O´Hara: Poet Among Painters), para os poetas da New York School, no início dos anos 50, através de uma antologia de poesia dadaísta publicada nos Estados Unidos, que se tornaria referência para Frank O´Hara, John Ashbery e James Schuyler, justamente através da poesia de franceses obscuros eexcêntricos como Pierre Albert-Birot e Raymond Roussell. Albert-Birot se tornaria também importante para poetas sonoros como Henri Chopin (que o inclui entre os mestres da vanguarda sonora em seu livro Poesia Sonora Internacional) e Bernard Heidsieck.
 
--- Ricardo Domeneck
 
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