Carlos Drummond de Andrade
Carlos Drummond de Andrade foi um poeta, contista e cronista brasileiro, considerado por muitos o mais influente poeta brasileiro do século XX.
1902-10-31 Itabira do Mato Dentro, Minas Gerais, Brasil
1987-08-17 Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil
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De 7 Dias
Começou festiva a semana:
espiávamos por uma frincha
a vitória, e eis que ela fulgura,
rosa aberta ao pé de Garrincha.
Ai, emoções de Gotemburgo!
Futebol que nos arrebatas,
esse rugir de alto-falante
vale mozartianas sonatas.
E torço firme a vosso lado,
cidadãos que morais no assunto,
embora entenda de pelota
simplesmente o que vos pergunto.
Quem ganhou foi o Botafogo,
canta o severiano, alma leve.
Exclama junto um pena-boto:
— É, e quem perdeu foi Kruschev.
Entre estouros, risos, foguetes,
assustado, lá foge o pombo
que bicava milho na praça,
mas surge Adalgisa Colombo,
escultura, graça alongada,
e a seus munícipes ensina
que entre todos os bens da terra
a beleza é graça divina.
E talento é a suprema dádiva:
penso nisso ao ver Pinga-fogo
no Dulcina, e a rara Cacilda
em seu sutilíssimo jogo
de emoção: a infância pisada,
um murmúrio de pai a filho,
diálogo obscuro das almas
para quem o sol é sem brilho.
E que delícia O protocolo,
velho Machado sempre novo!
Nosso teatro já floresce,
não é pinto a sair do ovo.
Mas nem tudo foram ditosas
horas no tempo brasileiro:
o vento no Convair, e a chuva.
A morte estava num pinheiro.
A morte estava à espera, surda,
cega a toda humana piedade.
E esse indecifrável mistério,
inscrição chinesa no jade,
faz baixar um crepe silente
sobre os gaios fogos votivos.
Que João e Pedro, das alturas,
suavizem a pena dos vivos.
E vem outro, mais outro dia.
Paira a esperança, junto à fé.
A bola em flor no campo: joia,
e seu ourives é Pelé.
22/06/1958
espiávamos por uma frincha
a vitória, e eis que ela fulgura,
rosa aberta ao pé de Garrincha.
Ai, emoções de Gotemburgo!
Futebol que nos arrebatas,
esse rugir de alto-falante
vale mozartianas sonatas.
E torço firme a vosso lado,
cidadãos que morais no assunto,
embora entenda de pelota
simplesmente o que vos pergunto.
Quem ganhou foi o Botafogo,
canta o severiano, alma leve.
Exclama junto um pena-boto:
— É, e quem perdeu foi Kruschev.
Entre estouros, risos, foguetes,
assustado, lá foge o pombo
que bicava milho na praça,
mas surge Adalgisa Colombo,
escultura, graça alongada,
e a seus munícipes ensina
que entre todos os bens da terra
a beleza é graça divina.
E talento é a suprema dádiva:
penso nisso ao ver Pinga-fogo
no Dulcina, e a rara Cacilda
em seu sutilíssimo jogo
de emoção: a infância pisada,
um murmúrio de pai a filho,
diálogo obscuro das almas
para quem o sol é sem brilho.
E que delícia O protocolo,
velho Machado sempre novo!
Nosso teatro já floresce,
não é pinto a sair do ovo.
Mas nem tudo foram ditosas
horas no tempo brasileiro:
o vento no Convair, e a chuva.
A morte estava num pinheiro.
A morte estava à espera, surda,
cega a toda humana piedade.
E esse indecifrável mistério,
inscrição chinesa no jade,
faz baixar um crepe silente
sobre os gaios fogos votivos.
Que João e Pedro, das alturas,
suavizem a pena dos vivos.
E vem outro, mais outro dia.
Paira a esperança, junto à fé.
A bola em flor no campo: joia,
e seu ourives é Pelé.
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