Fernando Pessoa
Fernando António Nogueira Pessoa, mais conhecido como Fernando Pessoa, foi um poeta, filósofo e escritor português. Fernando Pessoa é o mais universal poeta português.
1888-06-13 Lisboa, Portugal
1935-11-30 Lisboa
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Horror! Não sei ser inconsciente
Horror! Não sei ser inconsciente
E tenho para tudo, do que é bom
À inconsciência, o pensamento aberto,
Tornando-o impossível.
O amor causa-me horror é abandono,
Intimidade, mostrar (...) do ser
E eu tenho do alto orgulho a timidez
E sinto horror a abrir o ser a alguém,
A confiar n'alguém. Horror eu sinto
A que prescrute alguém, ou levemente
Ou não, quaisquer recantos do meu ser.
Abandonar-me em braços nus e belos
(Inda que deles o amor viesse)
No conceber de tudo me horroriza;
Seria violar meu ser profundo,
Aproximar-me muito doutros homens;
Uma nudez qualquer — espírito ou corpo (
Confrange-me: acostumei-me cedo
Aos despimentos do meu ser,
A fixar olhos púdicos, conscientes
Demais. Pensar em dizer «amo-te»
E «amo-te» só — só isto me angustia...
Pensar que ao rir (e mesmo que o não seja)
Exponho uma íntima parte de mim,
Para poder amar eu precisava
Esquecer que sou Fausto o pensador.
Eu queria era dormir, dormi, dormir,
Longo dormir, meio sentindo em sono,
E dormir sempre, sem consciência ter
Do tempo, só do sono sonolento
E da vacuidade do meu ser;
Dormir sem vir a morte, nem sonhar
Mas dormir só dormir, sempre dormir.
Que hoje já de dormir desaprendi.
Cansado de pensar, a pensar fico,
E as noites longas, longas, longas, longas,
E o pálido raiar de inda doutro dia...
Inda outro dia que trará ainda
Uma outra noite e essa mais dias, mais...
Insone sentir isto, e o deslizar
Suave e horroroso do tempo.
Cai então sobre mim todo o horror claro
E nítido e visível do mistério,
E eu tal fico em abalo e em comoção
Que durmo — sim que durmo de pesar-me
Tudo de mais p'ra mais poder sentir.
Então durmo... e antes eu não dormisse
Porque desordenadas incoerências
Mas não visões, só abstracções terríveis
(...)
E tenho para tudo, do que é bom
À inconsciência, o pensamento aberto,
Tornando-o impossível.
O amor causa-me horror é abandono,
Intimidade, mostrar (...) do ser
E eu tenho do alto orgulho a timidez
E sinto horror a abrir o ser a alguém,
A confiar n'alguém. Horror eu sinto
A que prescrute alguém, ou levemente
Ou não, quaisquer recantos do meu ser.
Abandonar-me em braços nus e belos
(Inda que deles o amor viesse)
No conceber de tudo me horroriza;
Seria violar meu ser profundo,
Aproximar-me muito doutros homens;
Uma nudez qualquer — espírito ou corpo (
Confrange-me: acostumei-me cedo
Aos despimentos do meu ser,
A fixar olhos púdicos, conscientes
Demais. Pensar em dizer «amo-te»
E «amo-te» só — só isto me angustia...
Pensar que ao rir (e mesmo que o não seja)
Exponho uma íntima parte de mim,
Para poder amar eu precisava
Esquecer que sou Fausto o pensador.
Eu queria era dormir, dormi, dormir,
Longo dormir, meio sentindo em sono,
E dormir sempre, sem consciência ter
Do tempo, só do sono sonolento
E da vacuidade do meu ser;
Dormir sem vir a morte, nem sonhar
Mas dormir só dormir, sempre dormir.
Que hoje já de dormir desaprendi.
Cansado de pensar, a pensar fico,
E as noites longas, longas, longas, longas,
E o pálido raiar de inda doutro dia...
Inda outro dia que trará ainda
Uma outra noite e essa mais dias, mais...
Insone sentir isto, e o deslizar
Suave e horroroso do tempo.
Cai então sobre mim todo o horror claro
E nítido e visível do mistério,
E eu tal fico em abalo e em comoção
Que durmo — sim que durmo de pesar-me
Tudo de mais p'ra mais poder sentir.
Então durmo... e antes eu não dormisse
Porque desordenadas incoerências
Mas não visões, só abstracções terríveis
(...)
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