Carlos Drummond de Andrade
Carlos Drummond de Andrade foi um poeta, contista e cronista brasileiro, considerado por muitos o mais influente poeta brasileiro do século XX.
1902-10-31 Itabira do Mato Dentro, Minas Gerais, Brasil
1987-08-17 Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil
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Entrevista (Exclusiva)
— Marechal, o senhor, que é candidato
ainda não registrado mas de fato,
poderá nos dizer o seu programa?
— Ah, quem dorme de pé não cai da cama.
Eu lhe dou, não promessas, mas decretos,
pois, pelos vaticínios mais corretos,
já ganhei a eleição na maciota,
já sou o presidente, tome nota.
— Mas, como assim?
— Pois o senhor não vê
que até perdendo ganha o PSD?
Napoleão, como sabe, era lotista,
e eu sou, eu sempre fui um pessedista.
— Já o era no 11 de Novembro?
— Bem, com franqueza, disso não me lembro.
— Suas ideias, marechal, quais são?
— Procedo, no momento, à seleção.
Do Josué chegou todo um caixote,
do Benedito veio-me outro lote.
O embrulhinho que pus a congelar
são as do meu compadre João Goulart.
(Acho meio cacete este serviço
de escolher, criticar. Não dou pra isso.)
E depois, em havendo precisão,
valho-me do ideário do Falcão:
boa-praça, tão hábil camarada,
que torna doce o fio de uma espada.
— Marechal, a reforma…
— Eu sei, agrária.
Depende, quer dizer, pois é tão vária
a condição rural, porém, contudo…
Fui claro, como vê, e disse tudo.
— E a inflação, marechal?
— É, a inflação!
Muita pedida e pouca produção,
foi o que me explicou ontem, por fim,
o doutor Zé Maria do Alkmim.
Repare que eu me informo. Em poucos dias
(escreveu-me, assombrado, o velho Bias)
fiquei sabendo mais que o Santos Vahlis
e o próprio embaixador Moreira Salles.
— E que me diz do deficit de escolas?
— Primeiro vou cuidar é das bitolas,
para uniformizá-las: trem de ferro,
soldado, jornalista… Dá-se um berro
e tudo entra nos trilhos, que o uniforme
(nos outros) significa um bem enorme:
ninguém pode falar, e assim calados
serão tranquilamente governados,
no mais perfeito e rijo enquadramento.
— Marechal, os partidos…
— Um momento.
O nome já revela: estão partidos,
mas saberei torná-los bem unidos
— pegue o mote —
num só e majestoso: o PDLote.
26/07/1959
ainda não registrado mas de fato,
poderá nos dizer o seu programa?
— Ah, quem dorme de pé não cai da cama.
Eu lhe dou, não promessas, mas decretos,
pois, pelos vaticínios mais corretos,
já ganhei a eleição na maciota,
já sou o presidente, tome nota.
— Mas, como assim?
— Pois o senhor não vê
que até perdendo ganha o PSD?
Napoleão, como sabe, era lotista,
e eu sou, eu sempre fui um pessedista.
— Já o era no 11 de Novembro?
— Bem, com franqueza, disso não me lembro.
— Suas ideias, marechal, quais são?
— Procedo, no momento, à seleção.
Do Josué chegou todo um caixote,
do Benedito veio-me outro lote.
O embrulhinho que pus a congelar
são as do meu compadre João Goulart.
(Acho meio cacete este serviço
de escolher, criticar. Não dou pra isso.)
E depois, em havendo precisão,
valho-me do ideário do Falcão:
boa-praça, tão hábil camarada,
que torna doce o fio de uma espada.
— Marechal, a reforma…
— Eu sei, agrária.
Depende, quer dizer, pois é tão vária
a condição rural, porém, contudo…
Fui claro, como vê, e disse tudo.
— E a inflação, marechal?
— É, a inflação!
Muita pedida e pouca produção,
foi o que me explicou ontem, por fim,
o doutor Zé Maria do Alkmim.
Repare que eu me informo. Em poucos dias
(escreveu-me, assombrado, o velho Bias)
fiquei sabendo mais que o Santos Vahlis
e o próprio embaixador Moreira Salles.
— E que me diz do deficit de escolas?
— Primeiro vou cuidar é das bitolas,
para uniformizá-las: trem de ferro,
soldado, jornalista… Dá-se um berro
e tudo entra nos trilhos, que o uniforme
(nos outros) significa um bem enorme:
ninguém pode falar, e assim calados
serão tranquilamente governados,
no mais perfeito e rijo enquadramento.
— Marechal, os partidos…
— Um momento.
O nome já revela: estão partidos,
mas saberei torná-los bem unidos
— pegue o mote —
num só e majestoso: o PDLote.
26/07/1959
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