Fernando Pessoa
Fernando António Nogueira Pessoa, mais conhecido como Fernando Pessoa, foi um poeta, filósofo e escritor português. Fernando Pessoa é o mais universal poeta português.
1888-06-13 Lisboa, Portugal
1935-11-30 Lisboa
3816393
159
2903
Os deuses desterrados, [1]
Os deuses desterrados,
Os irmãos de Saturno,
Às vezes, no crepúsculo
Vêm espreitar a vida.
Vêm então ter connosco
Remorsos e saudades
E sentimentos falsos.
É a Presença deles,
Deuses que o destroná-los
Tornou espirituais,
De matéria vencida,
Longínqua e inactiva.
Vêm, inúteis forças,
Solicitar em nós
As dores e os cansaços,
Que nos tiram da mão,
Como a um bêbedo mole,
A taça da alegria.
Vêm fazer-nos crer,
Despeitadas ruínas
De primitivas forças,
Que o mundo é mais extenso
Que o que se vê e palpa,
Para que ofendamos
A Júpiter e a Apolo.
Assim até à beira
Terrena do horizonte
Hipérion no crepúsculo
Vem chorar pelo carro
Que Apolo lhe roubou.
E o poente tem cores
Da dor dum deus longínquo
E ouve-se soluçar
Para além das esferas...
Assim choram os deuses.
12/06/1914
Os irmãos de Saturno,
Às vezes, no crepúsculo
Vêm espreitar a vida.
Vêm então ter connosco
Remorsos e saudades
E sentimentos falsos.
É a Presença deles,
Deuses que o destroná-los
Tornou espirituais,
De matéria vencida,
Longínqua e inactiva.
Vêm, inúteis forças,
Solicitar em nós
As dores e os cansaços,
Que nos tiram da mão,
Como a um bêbedo mole,
A taça da alegria.
Vêm fazer-nos crer,
Despeitadas ruínas
De primitivas forças,
Que o mundo é mais extenso
Que o que se vê e palpa,
Para que ofendamos
A Júpiter e a Apolo.
Assim até à beira
Terrena do horizonte
Hipérion no crepúsculo
Vem chorar pelo carro
Que Apolo lhe roubou.
E o poente tem cores
Da dor dum deus longínquo
E ouve-se soluçar
Para além das esferas...
Assim choram os deuses.
12/06/1914
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