Gonçalves Crespo

Gonçalves Crespo

António Cândido Gonçalves Crespo foi um jurista e poeta de influência parnasiana, membro das tertúlias intelectuais portuguesas do último quartel do século XIX.

1846-03-11 Rio de Janeiro, Brasil
1883-06-11 Lisboa
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Nera

I

Uma larga piscina, obra de um grego artista,
Atrai da alcova em meio a fascinada vista.

II

De trabalhado bronze um Pã malicioso
Finge na tênue flauta um canto harmonioso.

III

Uma estátua do Amor, de Paros cor-de-rosa,
Entre verdes festões assoma graciosa.

IV

Em jarras do Corinto esmaiam belas flores,
Espalham-se no ar suavíssimos olores.

V

O teto é de mosaico e ornado de figuras;
Riem pela parede eróticas pinturas.

VI

Sobre mesas de jaspe, orladas de embutidos,
Repousam jóias de ouro, esplêndidos vestidos.

VII

Nas púrpuras do leito ebúrneo uma criança
Dormita; a luz do sol lhe beija a loira trança.

VIII

Formosa! vista assim, no leito adormecida,
É náiade gentil em relva umedecida.

IX

Murmuram do clépsidro as águas. Entretanto
Nera seu corpo estira em flácido quebranto.

X

Abre — felino jeito! — os lábios cor-de-rosa,
Como em busca de um beijo, a dama voluptuosa.

XI

Sonha! julga sentir no rosto de açucena
Os beijos de Batilo, o gladiador da arena.

XII

Súbito, em toda a Roma a plebe dissoluta
"Ao Circo!" ruge e grita; a dama acorda e escuta.

XIII

Ergue o corpo de neve a linda Galatéia,
"Ao Circo!" e em seu olhar sorri ignota idéia.

1870


Publicado no livro Miniaturas (1871).

In: CRESPO, Gonçalves. Obras completas. Pref. Afrânio Peixoto. Rio de Janeiro: Livros de Portugal, 194
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